A MATRIA tem entre suas associadas muitas professoras do Ensino Médio e Superior e lamenta o que o transativismo está fazendo nas escolas e universidades: cotas para autoidentificados como trans sem embasamento em estudos ou na realidade; performances sexuais machistas e sexistas nas instituições; censura, perseguição e violência contra mulheres e suas pesquisas; o uso das estruturas universitárias e científicas para atos obscenos visando a autopromoção e gratificação sexual de indivíduos sem compromisso com a missão e os valores da educação e da universidade pública.
Nesse contexto, nós, professoras, temos vivido na pele o cerceamento do pensamento racional, da liberdade de expressão e do conhecimento.
Temos visto grupos oportunistas pleiteando e conseguindo cotas ilegítimas nas universidades. A MATRIA já mostrou que pessoas autodeclaradas trans não enfrentam, em média, obstáculos à escolarização e à empregabilidade. Porém, ativistas de grupos favorecidos têm coletado informações de casos de pessoas vulneráveis e manipulado seus dados para generalizar para todos, sem nenhum rigor e compromisso com a verdade.
Isso mostra sua falta de interesse em realmente ajudar as pessoas vulneráveis que eles dizem representar. É espantoso que as cotas raciais tenham precisado de décadas de pesquisas estatísticas e demográficas para serem efetivadas e, agora, as cotas para autodeclarados trans sejam aprovadas, sem que haja consulta pública às comunidades universitárias, e nem sequer uma pesquisa nacional com rigor metodológico e representatividade estatística que caracterize e justifique a política de cotas reservadas para esta população abstrata, não especificada e heterogênea.
Nós, docentes e pesquisadoras de diversas instituições e segmentos da educação, também testemunhamos consternadas o que o transativismo está fazendo com as escolas e universidades brasileiras. Nos últimos anos, observamos um avanço de visões anticientíficas no nosso meio, assim como práticas de coação, assédio e autoritarismo de transativistas, dirigidas sobretudo a alunas e docentes mulheres.
Vimos nos últimos anos minguarem as possibilidades de alunas e docentes estudarem e falarem da realidade das mulheres, pois são acusadas de "transfobia" quando não contemplam homens que se dizem mulheres em suas pesquisas sobre violência sexual, violência obstétrica, estupro, desigualdades no mercado de trabalho e assim por diante. Muitas dessas estudantes têm histórico de violência doméstica ou sexual, outras são mães solo, muitas vêm da periferia, e ainda assim são acusadas de terem privilégios, acossadas e silenciadas, sob o argumento anticientífico de que são “cisgênero” e, portanto, opressoras de homens que se declaram mulheres.
Dominando cada vez mais espaços, esses militantes têm protagonizado episódios lamentáveis nas nossas instituições. Utilizando recursos e estruturas das universidades públicas, figuras carreiristas produzem performances oportunistas, escandalosas, exibicionistas e sexistas para fins de marketing pessoal. Apresentam essas performances como "forma de conhecimento", mostrando que não têm nenhum compromisso com as universidades, sua missão e seus valores. Não à toa filmam e divulgam suas ações nas redes sociais, a fim de arregimentar seguidores, turbinar sua imagem pública, divulgar produtos e ampliar seu capital.
Um exemplo lamentável foi a recente participação de "Tertuliana Lustosa", uma pessoa do sexo masculino que se diz mulher, na Universidade Federal do Maranhão, ocasião em que debochou da educação universitária ao fazer uma exibição pornográfica, recebendo aplausos de várias pessoas do sexo masculino que se dizem mulheres pela sua apresentação machista. O evento, intitulado “Gênero para além das fronteiras” é um dos vários exemplos de como o transativismo sequestrou a agenda dos estudos sobre as mulheres para si, colocando no seu lugar exibições individualistas, narcisistas, deploráveis, baseadas em estereótipos e fantasias sexualizadas do feminino como objeto de exposição, desejo e consumo.
Tertuliana já havia feito o mesmo na Universidade Federal da Bahia e alardeado o evento em suas redes. Isso tudo mostra o modus operandi desse grupo, que usa a universidade para seus fins particulares. É curioso que o princípio do decoro, previsto em lei (Decreto 1.171, de Junho de 1994) e sob o qual se encontram os servidores públicos de nossas universidades federais, não se aplique a participantes que se apropriam de um espaço financiado com recursos públicos para eventos de produção e troca de conhecimento a fim de se auto-promover, através da exibição de seus fetiches particulares.
Além disso, esses militantes têm publicado em periódicos acadêmicos suas ruminações incoerentes e anti-científicas sobre suas práticas e fetiches sexuais, rebaixando a ciência e desmoralizando as Humanidades. Graças a eles, periódicos, que são espaços para a produção científica, exibem títulos deploráveis como “Quando a pedagogia encontra o punhetódromo”[1], “Educando com o cu: Introdução às pedagogias do corpo e do prazer”[2], “Espaço sexual: uma geografia do foder”[3], "Do infame sexual ao fisiológico pudico: a performance do sexo anal sob o olhar midiatizado da estética do liso"[4], “Performatividade da imagem e ressemantização do ânus: A performance da cuceta e a autenticidade de gênero”[5].
Eles se chamam de “dissidentes de gênero”. Porém, o que nós vemos na verdade são pessoas do sexo masculino adoecidas pelo consumo excessivo de pornografia, pelo machismo e pela objetificação das mulheres. Os banheiros femininos das universidades que eles frequentam exibem agora ameaças contra as alunas, recomendando coisas como: “metralha uma transfóbica”, “mata radfem”, entre outras gentilezas.
Todas essas práticas conflitam não só com a missão das instituições de ensino, que é a busca pela verdade e o serviço à sociedade, mas também geram ambientes abertamente hostis, especialmente para mulheres e meninas.
A universidade recebeu nas últimas décadas um enorme contingente de alunas, muitas oriundas de meios populares. Ambientes em que performances sexuais de homens adultos são admitidas e celebradas são um prato cheio para o assédio e a violência sexual, particularmente contra meninas e mulheres, pois rompem com acordos coletivos em torno de práticas de segurança e inadmissibilidade de comportamentos predatórios e violentos.
Instituições que permitem que as alunas e docentes sejam silenciadas, ameaçadas e obrigadas a se submeter são lenientes com a violência masculina e cúmplices da degradação do ensino e da pesquisa no Brasil. Nós, professoras associadas à MATRIA, repudiamos essas ações em nossas instituições. E exigimos que elas tomem atitudes enérgicas e efetivas para impedir o seu uso e abuso por esses atores de má fé.
Este manifesto será endereçado a todos os Reitores das universidades públicas.
Convidamos o leitor a apoiá-lo assinando aqui:
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Referências:
[1] CORREIA, S. C.; COLLING, L. Quando a Pedagogia encontra o punhetódromo: masturbação em uma Comunidade de Atendimento Socioeducativo de Salvador. Revista Educ. Form., [S. l.], v. 6, n. 2, p. e4446, 2021. https://revistas.uece.br/index.php/redufor/article/view/4446. Acesso em: 18 out. 2024.
[2] LUSTOSA, T. M.. Educando com o cu: Introdução às pedagogias do corpo e do prazer. Revista Periódicus, 2(19), 180–192, 2023. https://doi.org/10.9771/peri.v2i19.55050. Acesso em: 18 out. 2024.
[3] LOPES, J. N. D. Espaço Sexual: uma geografia do foder. Ensaios de Geografia, v. 11, n. 24, p. e112412, 1 jun. 2024. https://periodicos.uff.br/ensaios_posgeo/article/view/59115. Acesso em: 18 out. 2024.
[4] MATOSO, L. M. L., BEZERRA, J. S., & SILVA, F. E. A. da. Do infame sexual ao fisiológico pudico: a performance do sexo anal sob o olhar midiatizado da estética do liso. Passagens: Revista Do Programa De Pós-Graduação Em Comunicação Da Universidade Federal Do Ceará, 15(especial), 96–123, 2024. https://doi.org/10.36517/psg.v15iespecial.93080.Acesso em: 18 out. 2024.
[5] BONFANTE, G. M.; GONZALEZ, C. R. PERFORMATIVIDADE DA IMAGEM E RESSEMANTIZAÇÃO DO ÂNUS: A performance da cuceta e a autenticidade de gênero. ILUMINURAS, Porto Alegre, v. 23, n. 62, 2022. https://seer.ufrgs.br/index.php/iluminuras/article/view/116393. Acesso em: 18 out. 2024.