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Cisgeneridade: o perigo da redefinição para mulheres

A ideia de que existiria algo como "cisgeneridade" é recente; o termo foi inventado no final dos anos 90.

O raciocínio foi que, se algumas pessoas estavam se auto identificando como "transgênero" (e não mais como transexuais, travestis e crossdressers), então as demais deveriam receber um novo rótulo em contraposição: o de "cisgêneros".


A definição de pessoas "cisgêneras" é a daquelas que estariam "confortáveis ou congruentes com seus corpos" e com os signos socialmente impostos à seu sexo. Sabemos, no entanto, que essa concepção é falha e que em nossa sociedade, repleta de misoginia e diversos mecanismos produzidos para gerar insatisfação, raramente meninas e mulheres estão "confortáveis com seus corpos".


É a partir, inclusive, desta constatação, que mulheres lésbicas e desfeminilizadas têm sido empurradas para se definirem não mais como mulheres, mas como "homens trans", ao rejeitarem os símbolos da feminilidade.

O termo "cis" é incoerente com o conceito de gênero em sua concepção analítica. A afirmação de que alguém é coerente com o gênero designado ao nascer ignora as dinâmicas coletivas e estruturais. Além disso, o termo "cis" foi cunhado por médico "pedosexual" - o sexólogo que criou o "cis" também afirmou que "não há nada de errado com a pedofilia".


A ideia de que existem mulheres "cisgêneras", é perigosa, pois sugere que existem dois caminhos possíveis: ou estamos "de acordo com o gênero", concordando que os estereótipos inventados sobre e para nós são reais; ou não estamos "de acordo com o gênero" e devemos assumir uma "identidade transgênera". Para quem professa tal crença não existe a possibilidade de mulheres estarem em desacordo com o gênero e seguirem sendo mulheres.


Racismo e misoginia habitam tal crença, que pouco difere da ideia ultrapassada de que mulheres só podem ser de determinadas maneiras, ocupar apenas o espaço doméstico, estarem aptas apenas ao cuidado do lar e à maternidade, ou seja, a crença ultrapassada de que mulheres são aquelas que correspondem aos ideais de docilidade, fragilidade, delicadeza, e dependência.


O conceito de cisgeneridade traz consigo a ideia perigosa e desconectada da realidade de que existem dois tipos de mulher. A mulher cisgênera, correspondente ao ser humano nascido no sexo feminino e que está em "conformidade" com seu gênero; e a mulher transgênera, correspondente ao ser humano nascido no sexo masculino e em "desconformidade" com seu gênero. Na prática, denominar mulheres como "cis" implica na ideia de que homens podem ser mulheres, esvaziando completamente nossa classe sexual, nosso grupo histórico, político e cultural.


O resultado imediato é que os espaços de luta e de reivindicações das mulheres deixariam de ser exclusivos e se tornariam "unissex". Homens seguiriam como uma classe sexual e um grupo histórico, político e cultural bem definido. Mulheres seriam todos os outros. A consequência a médio e longo prazo, como já é possível observar nos Países que adotaram a definição de que mulheres são uma subcategoria de sua própria classe sexual, seria a erosão dos espaços, das categorias, das lutas e dos direitos das meninas e mulheres.


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